Sentença 5o JUIZADO ESPECIAL CÍVEL
PROCESSO N.:001/3.09.0027267-6
DEMANDANTE:MARCOS AURELIO ARAUJO DA ROSA
DEMANDADO: UNIMED COOP. DE TRAB. MÉDICO LTDA- UNIMED PORTO ALEGRE
PUBLICAÇÃO DA SENTENÇA: 26/08/2009
JUÍZA LEIGA: JUDITE VICHINSKI ROCHA
Vistos etc.
Dispensado o relatório nos termos do artigo 38 da Lei 9.099/95.
Procedo ao parecer.
I PRELIMINARES
1. COISA JULGADA
Ao contrário do que alega a ré, não há falar em coisa julgada. Ademais, apenas as sentenças que tenham decidido a disputa existente entre as partes (mérito), fazem coisa julgada material.
Rechaço a prefacial.
2.COMPLEXIDADE DA CAUSA – NECESSIDADE DE PERÍCIA
Afasto a prefacial.
Não há falar em incompetência do Juizado Especial para apreciar a matéria. A questão não pode ser reputada complexa, pois não há necessidade de realização de perícia contábil para calcular as diferenças, na medida em que é possível que se profira sentença líquida ou passível de liquidação, através de mero cálculo do contador.
II MÉRITO
Trata-se de ação declaratória, pela qual a parte autora pretende ver declarada a nulidade da cláusula contratual que prevê o aumento de percentual de reajuste por faixa etária para o plano de saúde que mantém desde 1994 com a requerida (UNIMED), em razão de ter atingido a idade de 60anos.
A ré contesta, defendendo a legalidade do aumento praticado, já que previsto contratualmente. Invoca jurisprudência em seu favor.
O contrato existente entre as partes foi firmado em 15/11/1994, fls.33/37.
A cláusula contratual contra qual se rebela a parte autora é a 20ª, §6º, do contrato de assistência à saúde, fls.33/37.
A questão tratada neste processo diz respeito à possibilidade dos contratos de assistência médico-hospitalar (planos de saúde) terem valores diferenciados em razão da idade do beneficiário.
Tal não significa não seja possível a adoção de solução de cunho protetivo ao idoso e também consumidor, notadamente porque esta encontra suporte da Constituição Federal, em especial nos artigos 230 (Princípio de Amparo aos Idosos), 5°, inciso XXXII e 170, V (os dois últimos dizendo respeito à proteção ao consumidor), fazendo-se, então, incidir, o Código de Defesa do Consumidor.
É certo que se mostra possível argumentar, em defesa da tese da ré, com o Princípio da Livre Iniciativa que tem por suporte os artigos 170 e 199 da Constituição Federal.
Tal antinomia, entretanto, resta suplantada diante da hierarquização axiológica de tais Princípios, adotando-se aqueles que se revelam dominantes ou que atendam a um Princípio Superior.
Quer parecer, assim, que tal colidência se pode solver com o Princípio da Dignidade (artigo 1°, inciso III, da Constituição Federal), impondo-se considerar que a adequada proteção ao idoso e ao consumidor tem estreita ligação com a própria dignidade enquanto objetivo do Estado Democrático de Direito.
Ademais, é possível analisar o contrato pela ótica do Código de Defesa do Consumidor fazendo uma interpretação teleológica (logo, atual) do fim do texto então existente, mas esta interpretação, como todas as outras, deve ser pró-consumidor (art. 47 do CDC), incorporando apenas o que vier a favorecê-lo e não o que vier a reduzir, limitar ou violar seus direitos assegurados pelo CDC e pela jurisprudência.
A jurisprudência tem entendido que a previsão de aumento da contribuição, em razão de mudança de faixa etária, por si só não é ilegal ou abusiva, quando houver informação esclarecida a respeito. A abusividade, porém, poderá ser reconhecida quando a previsão de tal cláusula servir como barreira à manutenção do vínculo, impedindo a permanência do consumidor idoso no sistema e, com isso, violar sua legítima expectativa de proteção contratual.
Nesse sentido os seguintes acórdãos:
“PLANO DE SAÚDE. AUMENTO DA CONTRIBUIÇÃO EM RAZÃO DE INGRESSO EM FAIXA ETÁRIA DIFERENCIADA. PREVISÃO CONTRATUAL. AUMENTO DE 100%. ABUSIVIDADE CONFIGURADA. APLICAÇÃO SIMULTÂNEA DA LEI 9.565/98 E DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTE JURISPRUDENCIAL. UNIFORMIZAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO. Dentre os novos sujeitos de direito que o mundo pós-moderno identifica, a Constituição Federal de 1988 concede uma proteção especial a dois deles, que interessa ao tema dos planos de saúde: o consumidor e o idoso. Disto resultam alguns efeitos no âmbito do direito privado, destacam-se uma comprometida interpretação da lei e das cláusulas contratuais e um maior rigor no controle de cláusulas abusivas. O idoso é um consumidor duplamente vulnerável, necessitando de uma tutela diferenciada e reforçada. (Recurso Cível Nº 71002026391, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em 16/07/2009)”
“PLANO DE SAÚDE. CONTRATO CELEBRADO SOB A VIGÊNCIA DO CDC. IMPLEMENTO DA IDADE DE 60 ANOS JÁ NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 10.741/03 (ESTATUTO DO IDOSO). ABUSIVIDADE DO REAJUSTE DA MENSALIDADE EXCLUSIVAMENTE COM BASE NA ALTERAÇÃO DA FAIXA ETÁRIA. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA AFASTADAS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. (Recurso Cível Nº 71002203255, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Afif Jorge Simões Neto, Julgado em 12/08/2009)”
"PREVIDÊNCIA PRIVADA. PLANO DE ASSISTÊNCIA MÉDICO-HOSPITALAR. RENOVAÇÃO CONTRATUAL RECUSADA COM BASE EM CLÁUSULA CONTRATUAL. ASSOCIADA QUE ATINGE IDADE CONSIDERADA COMO DE RISCO. Cláusula potestativa que ofende o interesse social não deve preponderar neste tipo de transação, já que o contrato vinha sendo sucessivamente renovado há mais de 10 anos, criando uma certeza de segurança no espírito da associada. Contrato de adesão e com cláusulas leoninas que visam obtenção de vantagens. Necessidade de intervenção do Estado nas disposições dos negócios para controle da liberdade contratual, evitando individualismos prejudiciais a uma das partes” (TJ/RS, 6ª CC, Ap. Cível n. 5960553799, j. em 20.08.96, rel. Des. Osvaldo Stefanello).
“CIVIL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. PLANO DE SAÚDE. RESCISÃO DO COMTRATO. 1. Pretensão de rescisão de contrato de seguro-saúde que vigorou durante vários anos, na fase em que o aderente mais necessita de assistência médica e hospitalar. É potestativa cláusula que admite a denúncia unilateral do contrato pela seguradora, ofendendo o art. 115 do Código Civil [de 1916]. 2. Os planos, quando criados, devem ser precedidos do necessário cálculo atuarial, feito para atender aos aderentes até que o evento futuro e certo na existência, mas incerto no tempo, o decesso do associado, venha a acontecer, nele incluídas as poucas consultas e internações da primeira idade e as muitas consultas e internações nas idades mais avançadas Se houver um só associado, o plano – que deu lucro à empresa de seguro na primeira fase – deve continuar atendendo e com recursos reservados para tal. Se o cálculo atuarial foi equivocado, por este equívoco o contratante não deve ser responsabilizado” (TJ/RS, 5ª CC, Ap. Cível 598081073, j. em 18.06.98, rel. Des. Carlos Alberto Bencke).”
Vejamos ainda jurisprudência das Turmas Recursais em Recurso Inominado nº 71001961176:
“(...) De fato, colidem, na hipótese, diversos princípios constitucionais. De um lado, o princípio constitucional da autonomia privada, da liberdade de iniciativa (art. 170, caput, da CF/88), inclusive na área de assistência à saúde (art. 199 da CF/88), bem como o direito fundamental de garantia do ato jurídico perfeito (art. 5º, XXXVI). De outro, a defesa do consumidor prevista como direito fundamental (art. 5º, XXXII), como princípio geral da ordem econômica (art. 170, V), como mandamento constitucional (art. 48 do ADCT), bem como o princípio constitucional de amparo às pessoas idosas (art. 230), com mandamento de tutela de sua dignidade e bem-estar.
(...) É sabido que a Lei 9.565/98 teve inúmeros de seus dispositivos sucessivamente alterados por medidas provisórias – que, ao não serem convertidas em Lei, no prazo constitucional, eram continuamente reeditadas. Numa das alterações, foi incluído o art. 35-E), com a seguinte redação:
“Art. 35-E. A partir de 5 junho de 1998, fica estabelecido pra os contratos celebrados anteriormente à data de vigência desta Lei que:
I – qualquer variação na contraprestação pecuniária para consumidores com mais de sessenta anos de idade estará sujeita à autorização prévia da ANS”.
...
§1º. Os contratos anteriores à vigência desta Lei, que estabeleçam reajuste por mudança de faixa etária com idade inicial em sessenta anos ou mais, deverão ser adaptados, até 31 de outubro de 1999, para repactuação da cláusula de reajuste, observadas as seguintes disposições:
I – a repactuação será garantida aos consumidores de que trata o parágrafo único do art. 15, para as mudanças de faixa etária ocorridas após a vigência desta Lei, e limitar-se-á à diluição da aplicação do reajuste anteriormente previsto, em reajustes parciais anuais, com adoção de percentual fixo que, aplicado a cada ano, permita atingir o reajuste integral no início do último ano da faixa etária considerada”.
Além disso, esse último dispositivo legal teve sua vigência suspensa em razão de medida cautelar concedida pelo STF, em 04/09/2003, na ação direta de inconstitucionalidade n. 1.931-8, em homenagem à proteção constitucional do ato jurídico perfeito. Em razão do disposto no art. 28, parágrafo único, da Lei 9.868/99, este julgamento tem efeito vinculante em relação a todos os órgãos do Poder Judiciário.
A tendência de impedir o agravamento das condições contratuais em razão de mudança de faixa etária restou consolidada com a edição do Estatuto do Idoso, cujo art. 15, §3º, dispõe peremptoriamente que:
§3º. É vedada a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade”.
Portanto, não se deixa de reconhecer o direito de majoração da mensalidade por conta da alteração da faixa etária, desde que observados critérios de proporcionalidade e de razoabilidade, e não a conduta de buscar fazer letra morta dos princípios que protegem os integrantes da terceira idade.
No caso em tela, o contrato prevê um aumento de 100% da mensalidade - - quando o contratante atinge a idade de 60 anos.
Tenho que o percentual de aumento é de todo despropositado, desarrazoado e desproporcional ao aumento dos riscos a que o contratante passou a estar sujeito, ao ingressar em outra faixa etária.
Assim, admitindo a possibilidade de aumento da contribuição do contratante, em razão de ingresso em faixa etária onde estatisticamente são mais prováveis as intercorrências médicas e hospitalares, parece despropositado que tal aumento seja do dobro do que o consumidor estava adimplindo.
Entendo pela retirada do percentual de reajuste por faixa etária – 60 anos, todavia deve ser mantido o índice do IGP-M, como índice de correção monetária do contrato.
Quanto ao pedido de restituição em dobro, do valor pago em 15/04/2009, f.44, tenho que a ré deve ser condenaDA a pagar o valor de R$239,71, sem a incidência do art. 42, § único, do CDC, em razão da sua não incidência no caso concreto.
ISSO POSTO, para os fins do art. 40 da Lei 9.099/95, a sugestão da decisão é pela PARCIAL PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS, para declarar a nulidade da cláusula 20ª §6, do contrato de assistência à saúde (fls. 33/37), no que se refere ao aumento de 100% do valor para a faixa etária de 60 anos, mantido o índice do IGP-M como índice de correção monetária, do contrato entre as partes, retroativo à data em que o autor atingiu 60 anos, devendo readequar as faturas a partir desta data, para o valor de R$239,71, em até 10 dias do trânsito em julgado, pena de multa diária de R$500,00, consolidada em 10 dias. Opino para condenar, a ré, ao pagamento do valor de R$239,71 (duzentos e trinta e nove reais e setenta e um centavos) corrigido pelo IGP-M da data do desembolso (05/05/2009) e acrescido de juros legais de 1% ao mês, para, parte autora. Opino ainda, para confirmar a liminar da f. 49.
Não há condenação em custas e honorários advocatícios, por força do artigo 54 da Lei 9099/95.
À apreciação do Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito para fins de homologação judicial, de acordo com o artigo 40 da Lei 9099/95.
Porto Alegre, 25 de agosto de 2009.
Judite Vichinski Rocha
Juíza Leiga
PROCESSO N.:001/3.09.0027267-6
DEMANDANTE:MARCOS AURELIO ARAUJO DA ROSA
DEMANDADO: UNIMED COOP. DE TRAB. MÉDICO LTDA- UNIMED PORTO ALEGRE
PUBLICAÇÃO DA SENTENÇA: 26/08/2009
JUÍZA LEIGA: JUDITE VICHINSKI ROCHA
Vistos etc.
Dispensado o relatório nos termos do artigo 38 da Lei 9.099/95.
Procedo ao parecer.
I PRELIMINARES
1. COISA JULGADA
Ao contrário do que alega a ré, não há falar em coisa julgada. Ademais, apenas as sentenças que tenham decidido a disputa existente entre as partes (mérito), fazem coisa julgada material.
Rechaço a prefacial.
2.COMPLEXIDADE DA CAUSA – NECESSIDADE DE PERÍCIA
Afasto a prefacial.
Não há falar em incompetência do Juizado Especial para apreciar a matéria. A questão não pode ser reputada complexa, pois não há necessidade de realização de perícia contábil para calcular as diferenças, na medida em que é possível que se profira sentença líquida ou passível de liquidação, através de mero cálculo do contador.
II MÉRITO
Trata-se de ação declaratória, pela qual a parte autora pretende ver declarada a nulidade da cláusula contratual que prevê o aumento de percentual de reajuste por faixa etária para o plano de saúde que mantém desde 1994 com a requerida (UNIMED), em razão de ter atingido a idade de 60anos.
A ré contesta, defendendo a legalidade do aumento praticado, já que previsto contratualmente. Invoca jurisprudência em seu favor.
O contrato existente entre as partes foi firmado em 15/11/1994, fls.33/37.
A cláusula contratual contra qual se rebela a parte autora é a 20ª, §6º, do contrato de assistência à saúde, fls.33/37.
A questão tratada neste processo diz respeito à possibilidade dos contratos de assistência médico-hospitalar (planos de saúde) terem valores diferenciados em razão da idade do beneficiário.
Tal não significa não seja possível a adoção de solução de cunho protetivo ao idoso e também consumidor, notadamente porque esta encontra suporte da Constituição Federal, em especial nos artigos 230 (Princípio de Amparo aos Idosos), 5°, inciso XXXII e 170, V (os dois últimos dizendo respeito à proteção ao consumidor), fazendo-se, então, incidir, o Código de Defesa do Consumidor.
É certo que se mostra possível argumentar, em defesa da tese da ré, com o Princípio da Livre Iniciativa que tem por suporte os artigos 170 e 199 da Constituição Federal.
Tal antinomia, entretanto, resta suplantada diante da hierarquização axiológica de tais Princípios, adotando-se aqueles que se revelam dominantes ou que atendam a um Princípio Superior.
Quer parecer, assim, que tal colidência se pode solver com o Princípio da Dignidade (artigo 1°, inciso III, da Constituição Federal), impondo-se considerar que a adequada proteção ao idoso e ao consumidor tem estreita ligação com a própria dignidade enquanto objetivo do Estado Democrático de Direito.
Ademais, é possível analisar o contrato pela ótica do Código de Defesa do Consumidor fazendo uma interpretação teleológica (logo, atual) do fim do texto então existente, mas esta interpretação, como todas as outras, deve ser pró-consumidor (art. 47 do CDC), incorporando apenas o que vier a favorecê-lo e não o que vier a reduzir, limitar ou violar seus direitos assegurados pelo CDC e pela jurisprudência.
A jurisprudência tem entendido que a previsão de aumento da contribuição, em razão de mudança de faixa etária, por si só não é ilegal ou abusiva, quando houver informação esclarecida a respeito. A abusividade, porém, poderá ser reconhecida quando a previsão de tal cláusula servir como barreira à manutenção do vínculo, impedindo a permanência do consumidor idoso no sistema e, com isso, violar sua legítima expectativa de proteção contratual.
Nesse sentido os seguintes acórdãos:
“PLANO DE SAÚDE. AUMENTO DA CONTRIBUIÇÃO EM RAZÃO DE INGRESSO EM FAIXA ETÁRIA DIFERENCIADA. PREVISÃO CONTRATUAL. AUMENTO DE 100%. ABUSIVIDADE CONFIGURADA. APLICAÇÃO SIMULTÂNEA DA LEI 9.565/98 E DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTE JURISPRUDENCIAL. UNIFORMIZAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO. Dentre os novos sujeitos de direito que o mundo pós-moderno identifica, a Constituição Federal de 1988 concede uma proteção especial a dois deles, que interessa ao tema dos planos de saúde: o consumidor e o idoso. Disto resultam alguns efeitos no âmbito do direito privado, destacam-se uma comprometida interpretação da lei e das cláusulas contratuais e um maior rigor no controle de cláusulas abusivas. O idoso é um consumidor duplamente vulnerável, necessitando de uma tutela diferenciada e reforçada. (Recurso Cível Nº 71002026391, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em 16/07/2009)”
“PLANO DE SAÚDE. CONTRATO CELEBRADO SOB A VIGÊNCIA DO CDC. IMPLEMENTO DA IDADE DE 60 ANOS JÁ NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 10.741/03 (ESTATUTO DO IDOSO). ABUSIVIDADE DO REAJUSTE DA MENSALIDADE EXCLUSIVAMENTE COM BASE NA ALTERAÇÃO DA FAIXA ETÁRIA. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA AFASTADAS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. (Recurso Cível Nº 71002203255, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Afif Jorge Simões Neto, Julgado em 12/08/2009)”
"PREVIDÊNCIA PRIVADA. PLANO DE ASSISTÊNCIA MÉDICO-HOSPITALAR. RENOVAÇÃO CONTRATUAL RECUSADA COM BASE EM CLÁUSULA CONTRATUAL. ASSOCIADA QUE ATINGE IDADE CONSIDERADA COMO DE RISCO. Cláusula potestativa que ofende o interesse social não deve preponderar neste tipo de transação, já que o contrato vinha sendo sucessivamente renovado há mais de 10 anos, criando uma certeza de segurança no espírito da associada. Contrato de adesão e com cláusulas leoninas que visam obtenção de vantagens. Necessidade de intervenção do Estado nas disposições dos negócios para controle da liberdade contratual, evitando individualismos prejudiciais a uma das partes” (TJ/RS, 6ª CC, Ap. Cível n. 5960553799, j. em 20.08.96, rel. Des. Osvaldo Stefanello).
“CIVIL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. PLANO DE SAÚDE. RESCISÃO DO COMTRATO. 1. Pretensão de rescisão de contrato de seguro-saúde que vigorou durante vários anos, na fase em que o aderente mais necessita de assistência médica e hospitalar. É potestativa cláusula que admite a denúncia unilateral do contrato pela seguradora, ofendendo o art. 115 do Código Civil [de 1916]. 2. Os planos, quando criados, devem ser precedidos do necessário cálculo atuarial, feito para atender aos aderentes até que o evento futuro e certo na existência, mas incerto no tempo, o decesso do associado, venha a acontecer, nele incluídas as poucas consultas e internações da primeira idade e as muitas consultas e internações nas idades mais avançadas Se houver um só associado, o plano – que deu lucro à empresa de seguro na primeira fase – deve continuar atendendo e com recursos reservados para tal. Se o cálculo atuarial foi equivocado, por este equívoco o contratante não deve ser responsabilizado” (TJ/RS, 5ª CC, Ap. Cível 598081073, j. em 18.06.98, rel. Des. Carlos Alberto Bencke).”
Vejamos ainda jurisprudência das Turmas Recursais em Recurso Inominado nº 71001961176:
“(...) De fato, colidem, na hipótese, diversos princípios constitucionais. De um lado, o princípio constitucional da autonomia privada, da liberdade de iniciativa (art. 170, caput, da CF/88), inclusive na área de assistência à saúde (art. 199 da CF/88), bem como o direito fundamental de garantia do ato jurídico perfeito (art. 5º, XXXVI). De outro, a defesa do consumidor prevista como direito fundamental (art. 5º, XXXII), como princípio geral da ordem econômica (art. 170, V), como mandamento constitucional (art. 48 do ADCT), bem como o princípio constitucional de amparo às pessoas idosas (art. 230), com mandamento de tutela de sua dignidade e bem-estar.
(...) É sabido que a Lei 9.565/98 teve inúmeros de seus dispositivos sucessivamente alterados por medidas provisórias – que, ao não serem convertidas em Lei, no prazo constitucional, eram continuamente reeditadas. Numa das alterações, foi incluído o art. 35-E), com a seguinte redação:
“Art. 35-E. A partir de 5 junho de 1998, fica estabelecido pra os contratos celebrados anteriormente à data de vigência desta Lei que:
I – qualquer variação na contraprestação pecuniária para consumidores com mais de sessenta anos de idade estará sujeita à autorização prévia da ANS”.
...
§1º. Os contratos anteriores à vigência desta Lei, que estabeleçam reajuste por mudança de faixa etária com idade inicial em sessenta anos ou mais, deverão ser adaptados, até 31 de outubro de 1999, para repactuação da cláusula de reajuste, observadas as seguintes disposições:
I – a repactuação será garantida aos consumidores de que trata o parágrafo único do art. 15, para as mudanças de faixa etária ocorridas após a vigência desta Lei, e limitar-se-á à diluição da aplicação do reajuste anteriormente previsto, em reajustes parciais anuais, com adoção de percentual fixo que, aplicado a cada ano, permita atingir o reajuste integral no início do último ano da faixa etária considerada”.
Além disso, esse último dispositivo legal teve sua vigência suspensa em razão de medida cautelar concedida pelo STF, em 04/09/2003, na ação direta de inconstitucionalidade n. 1.931-8, em homenagem à proteção constitucional do ato jurídico perfeito. Em razão do disposto no art. 28, parágrafo único, da Lei 9.868/99, este julgamento tem efeito vinculante em relação a todos os órgãos do Poder Judiciário.
A tendência de impedir o agravamento das condições contratuais em razão de mudança de faixa etária restou consolidada com a edição do Estatuto do Idoso, cujo art. 15, §3º, dispõe peremptoriamente que:
§3º. É vedada a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade”.
Portanto, não se deixa de reconhecer o direito de majoração da mensalidade por conta da alteração da faixa etária, desde que observados critérios de proporcionalidade e de razoabilidade, e não a conduta de buscar fazer letra morta dos princípios que protegem os integrantes da terceira idade.
No caso em tela, o contrato prevê um aumento de 100% da mensalidade - - quando o contratante atinge a idade de 60 anos.
Tenho que o percentual de aumento é de todo despropositado, desarrazoado e desproporcional ao aumento dos riscos a que o contratante passou a estar sujeito, ao ingressar em outra faixa etária.
Assim, admitindo a possibilidade de aumento da contribuição do contratante, em razão de ingresso em faixa etária onde estatisticamente são mais prováveis as intercorrências médicas e hospitalares, parece despropositado que tal aumento seja do dobro do que o consumidor estava adimplindo.
Entendo pela retirada do percentual de reajuste por faixa etária – 60 anos, todavia deve ser mantido o índice do IGP-M, como índice de correção monetária do contrato.
Quanto ao pedido de restituição em dobro, do valor pago em 15/04/2009, f.44, tenho que a ré deve ser condenaDA a pagar o valor de R$239,71, sem a incidência do art. 42, § único, do CDC, em razão da sua não incidência no caso concreto.
ISSO POSTO, para os fins do art. 40 da Lei 9.099/95, a sugestão da decisão é pela PARCIAL PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS, para declarar a nulidade da cláusula 20ª §6, do contrato de assistência à saúde (fls. 33/37), no que se refere ao aumento de 100% do valor para a faixa etária de 60 anos, mantido o índice do IGP-M como índice de correção monetária, do contrato entre as partes, retroativo à data em que o autor atingiu 60 anos, devendo readequar as faturas a partir desta data, para o valor de R$239,71, em até 10 dias do trânsito em julgado, pena de multa diária de R$500,00, consolidada em 10 dias. Opino para condenar, a ré, ao pagamento do valor de R$239,71 (duzentos e trinta e nove reais e setenta e um centavos) corrigido pelo IGP-M da data do desembolso (05/05/2009) e acrescido de juros legais de 1% ao mês, para, parte autora. Opino ainda, para confirmar a liminar da f. 49.
Não há condenação em custas e honorários advocatícios, por força do artigo 54 da Lei 9099/95.
À apreciação do Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito para fins de homologação judicial, de acordo com o artigo 40 da Lei 9099/95.
Porto Alegre, 25 de agosto de 2009.
Judite Vichinski Rocha
Juíza Leiga
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